“As Nadadoras” – um filme sobre o drama dos refugiados.

Ao longo dos 10 anos de pontificado, as palavras e gestos do Papa Francisco sempre nos lembraram que os migrantes têm rostos, um nome e uma história. Todos nos recordamos que o Papa Francisco escolheu como destino da primeira viagem como Pontífice a ilha de Lampedusa, no sul de Itália, que recebe os migrantes em trânsito pela rota mediterrânea, provenientes da África e Oriente Médio, mostrando, deste modo, uma preocupação com a realidade dos migrantes e refugiados, que dia após dia deixam as suas pátrias e famílias para fugir das guerras e da fome.

A propósito desta tão atual e dura realidade, proponho que vejam “As Nadadoras”, um filme da plataforma Netflix que conta a história de duas irmãs sírias que escaparam da Síria rumo à Europa, tornando-se refugiadas. Uma delas acabou por competir nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. Uma história dramática baseada em factos reais.

As duas irmãs – Yusra e Sara Mardini – participavam em competições de natação no seu país, a Síria, e viviam com os pais, a irmã mais nova e o pássaro de estimação. Um dia, quando estavam numa dessas competições de natação, o complexo onde se encontravam foi atingido por uma bomba, mas elas conseguiram sobreviver. O país estava a viver uma guerra civil que estava a devastar o país, e os dramas da violência, da corrupção e da liberdade de expressão impulsionavam um êxodo populacional. As duas irmãs percebem naquele momento que já não é seguro permanecer no país e decidem então tentar a sua sorte e rumar à Europa, juntamente com um primo. Os três viajam para a Turquia. Depois, apanham um barco que irá fazer a travessia até uma ilha grega, como forma de chegarem à Europa. Só que, pelo meio, vão deparar-se com inúmeros contratempos que tornam a sua jornada dramática. O motor teve um problema, provavelmente graças ao peso dos 18 migrantes que sobrelotavam a embarcação, e as irmãs não hesitaram em atirar-se para a água para usarem as suas habilidades de natação para agarrarem nas cordas e transportarem todos em segurança.

Deparam-se com o preconceito de vários cidadãos europeus e são enganadas por pessoas que fazem vida a transportar refugiados para a Europa, muitas vezes sem quaisquer condições de segurança — um negócio altamente lucrativo, mas criminoso.

O filme acompanha a sua trajetória até chegarem à Alemanha. Quando se aproximam de Berlim, as coisas também não serão tão fáceis como julgavam. Desejavam fazer um pedido de asilo para toda a família, incluindo os pais e a irmã que estão na Síria, mas não lhes dão essa possibilidade. Além disso, têm de viver num campo de refugiados e enfrentar um processo imenso de burocracia.

Começam a ser treinadas por um nadador local. Yusra mantém-se focada no treino, apesar de todas as adversidades, enquanto Sara se concentra mais na sua nova vida social em Berlim. Yusra acabou por conseguir juntar-se a uma equipa de refugiados nos Jogos Olímpicos do Rio 2016, a primeira equipa de atletas refugiadas da história da competição.

Hoje, Yusra é atleta olímpica e Embaixadora da Boa Vontade do ACNUR, atuando na defesa de refugiados em todo o mundo e partilhando a sua própria história inspiradora como um exemplo de resiliência e determinação. Sarah não esqueceu o que passou em Lesbos, voltando à ilha para ajudar outros refugiados, acabando detida pelas autoridades gregas sob acusação de tráfico humano, à semelhança de outros ativistas.

Este filme é um retrato da força, esperança, perseverança e superação que as jovens refugiadas sírias demonstraram face à decisão de sair de seu país para fugir à guerra, deixando a sua família, e arriscando tudo o que possuíam para procurar uma vida melhor.

Desde 2011, mais de 13,5 milhões de sírios foram afetados pela guerra, precisando de assistência humanitária e proteção. Deste total, 6,9 milhões estão deslocadas dentro do país e precisam de apoio para atender a necessidades básicas, como a alimentação. Fora do país, são mais de 6,6 milhões de sírios que cruzaram uma fronteira e buscaram proteção noutro país.

Neste último sábado, 18 de março, numa audiência no Vaticano, o Papa Francisco recebeu muitos refugiados chegados à Europa através de corredores humanitários e ouviu algumas das suas histórias, sublinhando que a integração "faz parte do salvamento". Esta iniciativa dos “corredores humanitários” protege a dignidade dos migrantes, derruba os muros da indiferença e oferece uma visão esperançosa para o futuro na Europa.

O Papa lembrou ainda que a história europeia se desenvolveu ao longo dos séculos através da integração de diferentes povos e culturas. “Portanto, não devemos ter medo do futuro!”. Dirigindo-se aos que promovem a integração dos refugiados, o Papa Francisco diz que estes representam o “rosto mais belo da Europa”, aquele que está aberto ao futuro.

Na Mensagem para o 108.º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado (25 de setembro de 2022), o Papa Francisco afirma que “Ninguém deve ser excluído. O plano divino é essencialmente inclusivo e coloca, no centro, os habitantes das periferias existenciais. Entre estes, há muitos migrantes e refugiados, deslocados e vítimas de tráfico humano. A construção do Reino de Deus é feita com eles, porque, sem eles, não seria o Reino que Deus quer. A inclusão das pessoas mais vulneráveis é condição necessária para se obter nele plena cidadania. (…) Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo» (Mt 25, 34-36).

“A presença dos migrantes e refugiados constitui um grande desafio, mas também uma oportunidade de crescimento cultural e espiritual para todos. Graças a eles, temos a possibilidade de conhecer melhor o mundo e a beleza da sua variedade. Podemos amadurecer em humanidade e, juntos, construir um «nós» maior”.

Por fim, importa referir que, nesta última terça-feira, 21 de março, foi divulgado o tema do 109.º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado que será celebrado no próximo dia 24 de setembro. O Papa escolheu como tema para a sua mensagem "Livres de escolher se migrar ou permanecer", com o intuito de promover uma renovada reflexão sobre um direito ainda não codificado a nível internacional: o direito a não ter que emigrar ou, por outras palavras, o direito a poder permanecer na própria terra.

Papa Francisco numa audiência no Vaticano, em 18 de março de 2023 (Alberto PIZZOLI)

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