Quaresma: o coração é o grande protagonista.

14 de fevereiro de 2024: Quarta-feira de Cinzas, início do período da Quaresma, os 40 dias em que nos preparamos para a Páscoa. Na linguagem popular e imaginária, a Quaresma equivale a um período de penitência, tristeza e lágrimas. Nada poderia estar mais errado! 14 de fevereiro de 2024: Dia de S. Valentim, celebração dos amantes. Na linguagem popular e imaginária é igual a ternura, mesmo um pouco sentimental, celebração, música, presentes. Como podem o amor e a renúncia coexistir positivamente? Pode ajudar-nos uma frase do cardeal Christoph Schönborn (Viena) que, em 2018, quando o Dia dos Namorados coincidiu com a Quarta-feira de Cinzas, disse que “podemos abrir mão de muitas coisas, mas não do amor”. No amor e no tempo da Quaresma o grande protagonista é o coração.

É-nos oferecido um “tempo forte, um tempo de graça”. Somos convidados a crescer e amadurecer com três companheiros de viagem: oração, caridade, jejum. Três dimensões da nossa vida - o nosso relacionamento com Deus, com os outros, connosco mesmos - a ser revisto e melhorado. Com uma palavra clássica: converter, mudar a direção das nossas escolhas. Se fizermos isso de coração, a Quaresma será uma preciosa oportunidade educacional.

Já o dizia Isaías (58, 4-10): a mudança começa por mudar o coração. Jejum externo não adianta, assim como de nada servem as penitências e os sacrifícios se não forem acompanhados de renúncia ao egoísmo (= amor próprio exclusivo) e ao amor pelas irmãs e irmãos que encontramos na família, no estudo, no trabalho, na comunidade, cada um com a sua história.

O caminho da Quaresma reflete o caminho da vida: muitas vezes difícil, cansativo, com muitos obstáculos, ilusões, deceções, medos, crises. A sociedade em que vivemos fala-nos de muitas pessoas, demasiadas! que têm medo da crise, não a aceitam e as consequências são, muitas vezes, a eliminação de obstáculos até à eliminação violenta das pessoas-obstáculo. No entanto, as “crises” são acontecimentos normais que nos ajudam a crescer e nos pedem discernimento.

Positivo, então, se este tempo de Quaresma nos coloca em crise, nos faz questionar, nos empurra a ser criativo. Conhecer-se e desenvolver plenamente os talentos recebidos é o primeiro ponto da espiritualidade do serviço por amor proposto pelo Movimento Oásis. O segundo ponto é sair de si mesmo para compreender as necessidades do ambiente onde se vive e tornar-se ativo num estilo de disponibilidade concreta para com os outros.

Concretude, portanto. Começamos decidindo quando e por quanto tempo parar para um encontro pessoal com o Senhor em oração. Vamos libertar as nossas mentes de preocupações e pensamentos e vamos ficar na presença do Senhor. Neste ano dedicado "à redescoberta do grande valor e da absoluta necessidade da oração na vida pessoal, na vida da Igreja e do mundo" (Papa Francisco, Angelus 21 de janeiro 2024) deixemo-nos atrair pela Palavra de Deus para ser enviada à humanidade. Escutemos Jesus e falemos com Ele para discernir como “cuidar dos outros com gestos concretos” (Papa Francisco, Angelus 11.02.2024). Num mundo dominado pelas redes sociais que muitas vezes nos fazem desperdiçar o nosso tempo, decidamos usar bem o tempo "descendo do palco da ficção para voltar ao coração" (Papa Francisco, 14.02.2024, Quarta-feira de Cinzas).

Não é fácil decidir, a boa vontade às vezes não é suficiente, em muitas mentes e corações se insinuam desculpas e dificuldades. As tentações nas quais é muito fácil cair. Como conquistá-los? Como ser mais forte?

Padre Rotondi falou de “um desporto da alma, um desporto do espírito que tem os seus exercícios para se fortalecer, desenvolver; um desporto do espírito como caminho para a liberdade” (30 entrevistas, capítulo desporto da alma). Conectado com esta realidade está o terceiro companheiro de caminho: o jejum. Não apenas tirar algo do nosso corpo para encher nossos corações e nosso espírito, mas sobretudo jejuar de alguns meios de comunicação social, a começar pelo uso excessivo de smartphones, tabagismo; jejuando de palavras inúteis, de palavras ofensivas. Como diz o bispo Santo Agostinho: “O jejum verdadeiramente grande, aquele que envolve todos homens, é a abstinência das iniquidades, dos pecados e dos prazeres ilícitos do mundo,…”

Não presos, mas livres para voltar a Deus, para viver a caridade com todo o coração e com toda a alma e amar o próximo como a nós mesmos. Tu não precisas de gestos sensacionais, mas de gestos simples como dizer olá com alegria, sorrir, agradecer; observa aqueles que têm fome de amor, sede de escuta, aqueles que são prisioneiros de situações dramáticas e oprimidas pela dor. Neles, recorda-nos Mt 25, 31-46, Jesus está presente.
Termino com uma partilha. Na minha Província, terra de fronteira e de convivência histórica entre três diferentes grupos linguísticos, a Quaresma é proposta não no âmbito eclesial, mas a toda a população.
A campanha de sensibilização deste ano - "Azione irRINUNCIABile" (20ª edição) - tem como lema: "Você é importante para mim, gestos indispensáveis de humanidade " foi idealizado pelo Fórum de Prevenção e pela Caritas e acolhido pelo Departamento de Educação e Formação e por mais de 40 instituições, organizações e associações educacionais. Não é preciso muito: um pouco de consciência sobre direitos humanos, diversidade, responsabilidade social e coexistência pacífica, um pouco de respeito e disponibilidade para ajudar - e aqueles que pertencem ao Movimento Oásis são especialistas em “serviço por amor” – valores frequentemente encontrados na nossa sociedade altamente competitiva são ofuscados pela desatenção, ignorância e egoísmo. Cultivemos a nossa humanidade com coragem e com o coração.
Anterior
Anterior

Mensagem do Papa Francisco para o 61.º Dia Mundial de Oração Pelas Vocações.

Próximo
Próximo

Inteligência artificial e paz.