VI dia mundial dos pobres.

Há uns tempos, deparei-me com estas palavras escritas: “Mais 250 milhões de pessoas em pobreza extrema até ao final do ano. A mais profunda queda da humanidade na pobreza de que há memória”. O autor, ou organização, referia-se ao ano em curso e ainda apenas tinham decorrido pouco mais de dois meses desde o início da iníqua invasão da Ucrânia por parte da Federação Russa. Trágica realidade que constituirá uma vergonha para a humanidade, pois estes números irão somar-se aos já cerca de 600 milhões de pobres existentes no mundo.

Em 13 de junho passado, o Papa Francisco, a partir do texto de Segunda Carta aos Coríntios 8, 9 “Jesus Cristo fez-se pobre por vós”, fazia publicar a sua mensagem para o 6º Dia Mundial dos Pobres a celebrar no próximo dia 13 de novembro.

A motivação do Santo Padre é um convite a que fixemos o nosso olhar em Jesus Cristo que “sendo rico, se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza”.

O Papa pretende fazer uma provocação dirigida a todos para que confrontemos a nossa vida com as muitas realidades de pobreza no mundo atual.

Uma das realidades a que alude na sua mensagem, é a guerra na Ucrânia. “Quantos pobres gera a insensatez da guerra! Para onde quer que voltemos o olhar, constata-se como os mais atingidos pela violência são as pessoas indefesas e frágeis. Deportação de milhares de pessoas, sobretudo meninos e meninas, para os desenraizar e impor-lhes outra identidade”.

Na mensagem, o Papa lembra os gestos de solidariedade, desde as primeiras comunidades cristãs, que dominicalmente, durante a celebração da Eucaristia, repetem o mesmo gesto, “pondo em comum as nossas ofertas para que a comunidade possa acudir às necessidades dos mais pobres. É um sinal de que os cristãos sempre procuraram cumprir com alegria e sentido de responsabilidade, para que a nenhum irmão ou irmã faltasse o necessário”, relembra.

Solidariedade é: “Partilhar o pouco que temos”.

A solidariedade, para o Papa, é precisamente partilhar o pouco que temos com quantos nada têm, para que ninguém sofra. “Quanto mais cresce o sentido de comunidade e comunhão como estilo de vida, tanto mais se desenvolve a solidariedade”, escreve o Papa.

Francisco faz referência no texto, aos países onde, nas últimas décadas, se verificou um significativo crescimento do bem-estar de muitas famílias, que alcançaram um estado de vida seguro e agradável. “Trata-se dum resultado positivo da iniciativa privada e de leis que sustentaram o crescimento económico, aliado a um incentivo concreto às políticas familiares e à responsabilidade social”, acentua. “Possa este património de segurança e estabilidade alcançado, ser agora partilhado com muitos dos que foram obrigados a deixar as suas casas e o seu país para se salvarem e sobreviverem. Como membros da sociedade civil, mantenhamos vivo o apelo aos valores da liberdade, responsabilidade, fraternidade e solidariedade; e, como cristãos, encontremos sempre na caridade, na fé e na esperança o fundamento do nosso ser e da nossa atividade”, escreve ainda o Santo Padre.

A pobreza que mata é a miséria, filha da injustiça, da exploração, da violência e da iníqua distribuição dos recursos. É a pobreza desesperada, sem futuro, porque é imposta pela cultura do descarte que não oferece perspetivas nem vias de saída. É a miséria que, enquanto constringe à condição de extrema indigência, afeta também a dimensão espiritual, que, apesar de muitas vezes ser transcurada, não é por isso que deixa de existir ou de contar. Quando a única lei passa a ser o cálculo do lucro no fim do dia, então deixa de haver qualquer freio na adoção da lógica da exploração das pessoas: os outros não passam de meios. Deixa de haver salário justo, horário justo de trabalho, e surgem novas formas de escravidão, suportada por pessoas que, sem alternativa, devem aceitar este veneno de injustiça a fim de ganhar o mínimo para comer.

Ao contrário, pobreza libertadora é aquela que se nos apresenta como uma opção responsável para alijar da estiva quanto há de supérfluo e apostar no essencial. De facto, pode-se individuar facilmente o sentido de insatisfação que muitos experimentam, porque sentem que lhes falta algo de importante e andam à sua procura como extraviados sem rumo. Desejosos de encontrar o que os possa saciar, precisam de ser encaminhados para os humildes, os frágeis, os pobres para compreenderem finalmente aquilo de que tinham verdadeiramente necessidade. Encontrar os pobres permite acabar com tantas ansiedades e medos inconsistentes, para atracar àquilo que verdadeiramente importa na vida e que ninguém nos pode roubar: o amor verdadeiro e gratuito. Na realidade, os pobres, antes de ser objeto da nossa esmola, são sujeitos que ajudam a libertar-nos das armadilhas da inquietação e da superficialidade, diz o texto da mensagem.

 O Papa chama a atenção na mensagem que, em relação aos pobres, não servem retóricas, que é necessário arregaçar as mangas e pôr em prática a fé através dum envolvimento direto, que não pode ser delegado a ninguém. No entanto, ele chama a atenção que às vezes, no entanto, pode sobrevir uma forma de relaxamento que leva a assumir comportamentos incoerentes, como no caso da indiferença em relação aos pobres. “Além disso acontece que alguns cristãos, devido a um apego excessivo ao dinheiro, fiquem empantanados num mau uso dos bens e do património. São situações que manifestam uma fé frágil e uma esperança fraca e míope”, reforça.

E, a concluir a mensagem, Santo Padre escreve: “Oxalá este VI Dia Mundial dos Pobres se torne uma oportunidade de graça, para fazermos um exame de consciência pessoal e comunitário, interrogando-nos se a pobreza de Jesus Cristo é a nossa fiel companheira de vida”.

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